Criatividade é prioridade na China

 

É claro que a China inventou a pólvora, o papel e a prensa tipográfica, mas o que fez desde então? Não o suficiente, temem os líderes comunistas.

A China possui uma das maiores economias do mundo, e uma que está crescendo rapidamente, mas os velhos líderes de Pequim sabem que seu país não se tornará uma superpotência mundial produzindo eternamente camisetas baratas ou até mesmo carros e telefones celulares.

Para prosperar na nova economia, eles sabem que devem estar na dianteira da C&T.

Mas a China não produziu nenhum vencedor de Prêmio Nobel e promoveu poucos avanços científicos no último século. Ela construiu uma bomba atômica nos anos 60, mas ainda está lutando para colocar um homem no espaço. (agora alcançado)

Para melhorar sua posição internacional, Pequim tornou a inovação científica uma de suas maiores prioridades. Para conseguir isto, os especialistas recentemente voltaram sua atenção para o que acreditam ser a raiz do problema: seu sistema educacional rígido está roubando a criatividade de suas crianças.

"Os círculos científicos estão dando atenção à criatividade, especialmente após termos entrado para a OMC (Organização Mundial de Comércio)", disse Zhai Liyuan, o físico que chefia a divisão de educação da Associação de C&T da China.

"A China tem muito poucas patentes registradas em países estrangeiros e sua capacidade de inovação é baixa. Se continuarmos ignorando o estimulo à criatividade nas próximas gerações, será difícil para a China se tornar forte".

O problema da criatividade chamou a atenção das esferas mais altas. A Liga da Juventude Comunista, a Associação de C&T da China e o Ministério da Educação formaram um comitê conjunto em 98 para estudar o problema e de lá para cá revisou livros escolares, reciclou professores e lançou algumas aulas de ciência experimentais ao ‘estilo ocidental’.

Na Escola Primária Experimental Nº.2 na zona oeste de Pequim, o visitante podia perceber o primeiro sinal de algo incomum antes mesmo de entrar na sala de aula: o barulho era alto.

Naquela manhã os alunos da quarta série estavam trabalhando em grupos de quatro para estudar o movimento pendular. Todos estavam falando.

Desde o ano passado, o programa ‘pondo a mão’ com inspiração americana encoraja a exploração científica ao estimular os estudantes a realizarem suas próprias experiências simples e extrair suas próprias conclusões.

"Não há livro escolar", disse Feng Hong, um administrador da escola. "A aula enfatiza o processo. Antes nós nos concentrávamos apenas no resultado".

Promover a criatividade é a meta, mas o verdadeiro objetivo da China é o resultado final.

A China enviou recentemente várias delegações para a Índia para tentar entender o segredo do sucesso de sua indústria de software. É a única área onde a economia da Índia supera em muito a da China. Os cerca de US$ 8 bilhões em exportações de software da Índia no ano passado superaram em muito os US$ 600 milhões da China.

Escrever bons códigos de computador exige uma boa quantidade de criatividade e os chineses descobriram que a vantagem da Índia deriva em boa parte de seu sistema de ensino. No momento, o tipo de software mais vendido pela China é do tipo pirateado.

De fato, de autopeças e mochilas até computadores, as indústrias chinesas vivem da cópia ou do uso de tecnologia importada.

O China Economic Times citou recentemente um executivo da indústria farmacêutica como tendo dito que 97% dos medicamentos químicos produzidos pelos laboratórios chineses são produtos copiados. Eles gastam apenas 2% de sua renda em pesquisa e desenvolvimento. Ele disse que a indústria farmacêutica da China não sobreviverá se não inovar.

Que a educação formalizada tem efeito negativo sobre a criatividade natural dos estudantes é um fato de conhecimento em todo o mundo. Porém o sistema educacional da China, voltado basicamente para a realização de provas, um vestígio de seu sistema de avaliação imperial, é mais rígido que a maioria.

"O sistema chinês cultiva pessoas obedientes", disse Zhai. "Quando levo os estudantes para o exterior para competições (de ciência), encontro uma grande diferença entre nossos estudantes e os estudantes estrangeiros". Zha Zixiu, uma professora de Psicologia da Academia Chinesa de Ciências, realizou vários estudos para avaliar a criatividade das crianças chinesas.

Em um estudo conjunto com a Alemanha, ela descobriu que os estudantes chineses são melhores em pensamento lógico enquanto os estudantes alemães são melhores em pensamento criativo. O sistema escolar é o principal responsável, disse ela.

"Todo o conceito de educação tem que mudar, de cima a baixo, se quiser estimular a criatividade nas crianças", disse ela.

Nas escolas chinesas, a memorização é mais valorizada do que a solução de problemas, e o foco está no ensino ao invés da aprendizagem. Nas aulas de matemática, os professores às vezes ensinam os estudantes a resolverem problemas matemáticos os copiando várias vezes.

"Basicamente os professores não se afastam do texto", disse Zha. "Eles falam e os alunos escutam, e a maioria faz poucas perguntas. Quando os estudantes respondem perguntas, eles respondem o que o professor disse ou o que o livro disse".

Para a admissão na faculdade o único teste que importa é um exame nacional de três dias, que determina quais colegiais ocuparão as 2,2 milhões de vagas em faculdades e para onde irão.

Por anos, especialistas criticaram o teste, mas Zhai, da Associação de C&T, disse que dificilmente ele será mudando ou eliminado devido à ampla corrupção na sociedade.

Um teste nacional único, apesar de não ser o melhor indicador de potencial ou realização, é a melhor forma de evitar trapaças, favoritismo ou outros tipos de fraudes de admissão nas faculdades.

De forma geral, o progresso no cultivo da criatividade tem sido lento. Zhai disse que as crianças na Escola Primária Experimental Nº.2 já terão crescido há muito tempo antes que o país produza um ganhador de Prêmio Nobel.

(Apesar de chineses já terem recebido prêmios Nobel, todos eles realizaram seus trabalhos premiados - seja de pesquisa científica ou de criações literárias - enquanto estavam no exterior.)

Mas a inovação científica, como sabem os especialistas, não se resume apenas a ganhar prêmios. "O que a sociedade necessita é de pessoas inovadoras", disse Zha, professora de Psicologia.

"Se o pensamento das crianças se tornar rígido, então será impossível ter um país desenvolvido e próspero. Nos tempos antigos, a cultura era mais desenvolvida".

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Artigo de Julie Chao (Cox News Service): "China looks to reclaim creativity", publicado em 13.05 no The Washington Times. Tradução de George El Khouri Andolfato, Uol.com/Mídia Global, 12/05.